O Brasil, desde a década de 1930, se preocupa com questões ambientais. Foi pioneiro em legislações sobre o tema com a publicação do Código de Águas e o com o Código Florestal, ambos instituídos em 1934. Políticas ambientais, sociais e de governança de Estado antecedem e se fortalecem com a Constituição de 1988. O ESG (Environmental, Social and Governance) – em português: ambiental, social e governança – é uma sigla que surgiu em 2004 em uma publicação do Pacto Global em parceria com o Banco Mundial, chamada Who Cares Wins. Surgiu de uma provocação do secretário-geral da ONU, Kofi Annan, a 50 CEOs de grandes instituições financeiras sobre como integrar fatores sociais, ambientais e de governança no mercado de capitais. Naquele momento, o Brasil já atuava nas agendas dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) e sempre foi bastante atuante nos objetivos do Pacto.
Em 2012, por exemplo, na Rio +20 o governo e as empresas brasileiras já pensavam conjuntamente em como atingir as metas 2030 em parcerias. Porém, de forma integrada com a sigla ESG, segundo estudo inédito do Pacto Global junto a Stilingue, sobre a evolução do ESG no Brasil, a discussão do tema se inicia mesmo em 2019. O ESG está conectado às métricas de investimentos ligados aos ganhos e compromissos com os shareholders, ou seja, os acionistas. Segundo o BNDES, a primeira evidência de que os critérios ESG terão importância efetiva para a alocação de recursos na economia vem do fato de que o movimento ESG nasce dos próprios acionistas das empresas, e não em oposição a eles, como ocorrera no passado.
Há muitas empresas no Brasil preocupadas com a sustentabilidade de seus negócios e que já estão implementando conceitos ESG antes mesmo da definição da sigla em suas operações e estratégias produtivas. Muitas instituições estão começando a compreender a importância dos conceitos ESG para o desempenho financeiro e para a sustentabilidade a longo prazo e, com isso, estão tomando medidas para integrar esses conceitos em suas operações e práticas de negócios. Porém, a implementação de conceitos ESG ainda é limitada e a cultura empresarial precisa evoluir para valorizar a responsabilidade social e ambiental.
Para se tornar uma empresa comprometida com as metas ESG é importante entender como isso afeta seu negócio. Existem diferentes métodos para realizar essa identificação, como a matriz de materialidade recomendada pelo GRI (Global Reporting Initiative), entre outros indexadores existentes no mercado. Como parte de sua estratégia de ampliação do portfólio de índices ESG, a B3 lançou, em setembro de 2020, em parceria com a S&P Dow Jones, o índice S&P/B3 Brasil ESG, que utiliza critérios baseados em práticas ambientais, sociais e de governança para selecionar empresas brasileiras para sua carteira. Entre os critérios adotados está a aderência aos Dez Princípios do Pacto Global na área de Direitos Humanos, Trabalho, Meio Ambiente e Anticorrupção. E ainda, o Pacto Global da ONU criou um guia chamado SDG Compass, cinco passos que ajudam as empresas a entenderem os seus impactos relacionados aos ODS e a estabelecerem metas compatíveis.
O que pode dificultar uma empresa brasileira ou que pode ser considerado ponto fraco é a falta de transparência das empresas nacionais em como comunicarem aos seus investidores sobre seus controles, processos, ganhos e suas relações com stakeholders, em comparação a outras empresas que já possuem um grau de maturidade maior em termos de governança corporativa. Além de capacidade técnica interna e cumprimento de metas com priorização, é importante observar que o ambiente exógeno aos negócios também influencia a aplicabilidade das metas. Um país com um ambiente político regulatório de instabilidade dificulta a implementação de agendas ESG e pode, até mesmo, promover um cenário de pouca segurança aos investimentos.
Em geral, é importante lembrar que a comparação do desempenho ESG entre empresas de diferentes países pode ser desafiadora devido às diferenças regulatórias, culturais e de contexto. Com a finalidade de contribuir com a implementação dos conceitos do ESG, a Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) publicou, em 2022, uma nova norma que se propõe a trazer conceitos sobre cada um dos eixos do ESG (ambiental, social e governança) e métodos de auto aferição para que indústrias de qualquer porte possam medir a extensão e o impacto de suas iniciativas nesses temas, o que serve também como instrumento para diagnóstico situacional e identificação de pontos a serem aprimorados. A normatização dos conceitos ESG é importante para segurança jurídica de iniciativas adotadas pelas empresas e para quem investe nelas.
Por isso, vale destacar o conceito de Governança Corporativa (G) e a sua relevância no Brasil, uma vez que o país tem enfrentado desafios relacionados a questões de transparência e responsabilidade nas empresas. Nesse sentido, considerando que um dos aspectos essenciais de governança é a transparência das ações do governo e de sua interação entre os agentes, o Brasil, desde 1994, possui parceria com a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE)[1] e busca, desde o primeiro governo Lula, fazer parte do grupo de países que compõe essa organização. A OCDE busca melhores práticas de governança de seus países membros, uma democracia sólida e instituições seguras e confiáveis. Logo, para fazer parte da OCDE é importante que os países membros possuam boas práticas compatíveis com aqueles que desejam se tornar seus integrantes, entre elas, regras e transparência nas relações entre as organizações da sociedade e as várias esferas do governo. Ou seja, regulamentar o lobbying no Brasil é fator de governança internacional. Como diz o professor da USP, Wagner Mancuso, a regulamentação do lobbying como instrumento de governança fortalece o sistema de controles, de transparência, de acessos e de participação, além disso, amplia a participação de segmentos sociais desmobilizados.
Dentro das empresas, uma das principais competências do time de Relações Institucionais e Governamentais (RIG) é a de ser guardião da transparência, controles e boas práticas das relações com o governo. O ESG e as Relações Institucionais e Governamentais se conectam diante do ambiente de governança corporativa e diante do relacionamento com stakeholders, sendo o lobbying parte desse processo de relacionamento. Além do princípio de identificar os agentes e os interesses desses stakeholders, compete ao time de relações governamentais monitorar, buscar estratégias de influência de agendas governamentais, internacionais ou até mesmo de políticas internas das empresas com o propósito de atingir as metas e indicadores de ESG. O alinhamento dos indicadores ESG com os stakeholders é um processo importante para garantir que a empresa esteja atendendo às expectativas e preocupações dos grupos que têm interesses diretos ou indiretos na empresa. O primeiro passo para esse alinhamento é identificar e conhecer seus stakeholders. A empresa deve identificar e entender seus stakeholders relevantes, incluindo acionistas, clientes, fornecedores, funcionários, governos, comunidades e meio ambiente.
O time de RIG também pode analisar a possibilidade de aprimorar políticas públicas e agendas regulatórias que impactem as agendas ESG da sua empresa ou do setor em que atua, por meio da influência positiva de seus interesses e por meio de suas entidades representativas e coalizões que adotam práticas sustentáveis. É importante que esse processo seja feito de forma ética e transparente, sem prejudicar os objetivos de sustentabilidade e responsabilidade social das empresas. Outro ponto muito importante que também cabe ao time de relações institucionais e governamentais, conjuntamente a outras áreas afins nas empresas, é o papel de advocacy. O advocacy é o ato de defender ou promover uma causa ou ideia e, no contexto do ESG, ele pode ser usado para influenciar as práticas das empresas e das políticas públicas de maneira positiva, de acordo com os princípios de sustentabilidade e responsabilidade social. Um bom exemplo de advocacy é a Coalizão Brasil Clima, Florestas e Agricultura, um movimento composto por mais de 300 representantes do setor privado, do setor financeiro, da academia e da sociedade civil, com objetivo de elevar a liderança do Brasil em uma nova economia de baixo carbono, competitiva, responsável e inclusiva.
O ESG tem sido cada vez mais importante para a reputação das empresas, uma vez que investidores, consumidores e outros stakeholders estão cada vez mais conscientes da importância das questões ambientais, sociais e de governança para o desempenho a longo prazo de uma empresa. Uma boa reputação ESG pode ajudar a atrair e reter investidores, aumentar a lealdade dos clientes e aumentar a confiança pública na empresa. Por outro lado, más práticas ESG podem levar a danos irreparáveis à reputação da empresa e afetar seu desempenho financeiro. Por isso, cabe também aos times de relações governamentais atuar para que as empresas monitorarem e melhorem continuamente suas práticas ESG, mitiguem riscos e protejam sua reputação em busca de implementar os seus indicadores para o bom desempenho e sustentabilidade dos negócios no longo prazo.
[1] A Organização permite a troca de informações e alinhamento de políticas entre os países-membro com o objetivo de potencializar o crescimento econômico e contribuir para o desenvolvimento de todos os participantes, tornando-se um importante ator na busca de soluções de políticas públicas em um mundo globalizado. https://www.gov.br/casacivil/pt-br/assuntos/ocde/sobre-a-ocde-1/sobre-a-ocde
Giuliana Franco é diretora da Abrig e coordenadora do Comitê ESG da mesma entidade