ESG e risco político no Brasil na esteira de um Green New Deal

Novos fenômenos econômicos e sociais transformaram a análise de risco político, nas suas naturezas mais diversas —econômica, regulatória ou de integridade—, para além das ações de governos e reguladores. Estudiosos, como a ex-secretária de Estado dos EUA e professora da Universidade de Stanford, Condoleeza Rice, definem risco político como a probabilidade de qualquer ato político impactar negócios, seja positiva ou negativamente.

Qualquer ator com iniciativas politicamente motivadas – como consumidores, competidores, movimentos da sociedade civil e mesmo funcionários — têm sido empoderados pelas redes sociais nos últimos anos. Isso tornou latente sua capacidade de, individual ou coordenadamente, promoverem impactos significativos – inclusive financeiros – em empresas de múltiplos setores.


Nesse contexto, temas socioambientais e de governança têm ocupado espaço cada vez maior em discussões corporativas. O encontro de tendências ESG com riscos políticos representa desafios importantes para o ambiente de negócios, mas também oportunidades. As empresas que se anteciparem a este cenário sairão na frente nos seus mercados, se posicionando para liderarem a nova agenda econômica do mundo pós-pandemia. Há, afinal, uma série de vetores impulsionando de forma contundente temas de ESG no Brasil e no mundo.


Em primeiro lugar, é provável que o escrutínio social frente às políticas socioambientais das empresas siga aumentando, exigindo que elas implementem planos inteligentes para lidar com temas ESG. Esses planos devem incluir avaliações de riscos abrangentes no contexto da entrada em novos mercados, protocolos de compliance rigorosos e políticas de monitoramento contínuo. Em setores em que há um impacto socioambiental mais nítido, como mineração e celulose, o contato proativo e permanente junto a comunidades locais seguirá sendo uma ferramenta fundamental para a mitigação de ameaças reputacionais e operacionais.


Riscos indiretos também precisarão ser cada vez mais considerados. É o caso, por exemplo, de empresas que se encontram sob escrutínio pelas ações de seus fornecedores, sejam eles prestadores de serviços eventuais ou parte regular da sua cadeia de supply chain. Nos últimos anos, afinal, boicotes e outras ações similares recorrentes envolvendo empresas de setores variados têm se tornado constantes. Políticas de due diligence e de checagem de antecedentes seguirão sendo as melhores ferramentas para a mitigação de riscos dessa natureza.


Há, ainda neste contexto, iniciativas importantes a serem consideradas no âmbito dos riscos indiretos, como, por exemplo, o negative-listing por parte de investidores. Em maio de 2020, o Norges Bank – o maior fundo soberano do mundo, da Noruega – resolveu excluir uma série de empresas e setores do seu portfólio, em função das suas novas políticas de ESG, um exemplo entre tantos outros na indústria de fundos de investimento no último ano.


Numa perspectiva geopolítica, o presidente Joe Biden nos Estados Unidos acelerou o processo de implementação de agendas ESG. A agenda ambiental de Biden se somará à já reconhecida postura pró-sustentabilidade da União Europeia, o que significa que as pressões do mundo desenvolvido em mercados emergentes, e no Brasil não será diferente, virão de várias frentes e de forma coordenada.


Aqui, no país, o desafio será enorme, incluindo as dificuldades da questão orçamentária, mas há amplas oportunidades. A despeito da postura do governo federal, o país continua a apresentar virtudes preciosas em vários setores que podem se beneficiar do tema. Destaca-se, por exemplo, um promissor mercado de green bonds, especificamente para projetos em segmentos como energia, saneamento e mobilidade urbana. Há, ainda, oportunidades de fortalecimento reputacional para empresas que adotem e comuniquem bem suas credenciais verdes nos mais variados setores, como instituições financeiras e empresas de varejo. Na indústria, há cada vez mais evidências sustentando os benefícios para companhias que adotam estratégias em torno da chamada economia circular, em que há uma otimização do aproveitamento de recursos bem como um engajamento ativo da comunidade na sua gestão.


O Brasil também deve continuar se beneficiando do atual panorama de elevada liquidez global, que incentiva investidores estrangeiros a procurarem ativos variados em mercados emergentes. É inevitável que estes investimentos venham associados a padrões crescentemente elevados de sustentabilidade – o que significa que atores locais que desejem se beneficiar destes investimentos se antecipem a tais demandas, que irão passar, inclusive, a ter cada vez mais uma natureza também regulatória.


A retomada econômica no pós-pandemia ainda está marcada por múltiplas incertezas. A proeminência de temas ESG neste processo, no entanto, não é uma delas. Riscos políticos, por sua vez, seguem tão latentes como nunca. Dada sua estreita – e, na verdade, potencialmente virtuosa associação, vale a pena enxergar os dois temas de forma integrada.


Gabriel Brasil é economista, mestre em Economia Política Internacional e analista de risco político da consultoria britânica Control Risk.


*Os conteúdos publicados são de inteira responsabilidade de seus autores. As opiniões neles emitidas não exprimem, necessariamente, o ponto de vista da Abrig.  


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