Políticas culturais e desenvolvimento

ABRIG: A cultura é um elemento que nos conecta como sociedade. As produções artísticas expressam e retratam os hábitos e os costumes de um povo, criando uma identidade nacional. No seu entendimento, como podemos descrever a cultura brasileira?


LEILA BARROS: A cultura talvez seja o nosso principal patrimônio. Bendita Nação, esta nossa, pois nela podemos encontrar expressões que vão do Carnaval ao festival de Parintins; do São João, às Cavalhadas, passando pelo Bumba-meu-Boi e a tradição fortemente ligada ao campo do pampa gaúcho. Exportamos para o mundo a Bossa Nova e a música sertaneja. Nossa cultura também está posta na mesa por meio da culinária. O tempero dos romances de Jorge Amado e a universalidade da poesia de Drummond conquistam e encantam corações até hoje. Somos ricos herdeiros da miscigenação de nossa gente. No caldeirão da cultura brasileira, temos ingredientes africanos, indígenas e europeus. Por isso, possuímos essa riqueza única no mundo. Eu diria que a nossa cultura é o melhor resumo do que somos como civilização.


ABRIG: A cultura também é um setor econômico. A economia cultural envolve tanto a economia tradicional das artes e do patrimônio, como também o mercado de trabalho dos artistas, direitos autorais e a indústria do entretenimento, como a música, cinema, radiodifusão, livros, videogames, entre outros. A Comissão de Educação, Cultura e Esporte tem instrumentos para desenvolver e fortalecer a economia cultural?


LEILA BARROS: Lamentavelmente, a cultura brasileira está atravessando o que costumam chamar de “tempestade perfeita”. O que já não vinha bem em virtude de um governo que enxerga a cultura como um instrumento de manipulação ideológica, degringolou de vez com a pandemia e a crise econômica. A situação, a meu ver, é delicada. A começar pela ameaça à própria sobrevivência dos artistas. Em 31 de março, aprovamos, no Senado, projeto prorrogando a Lei Aldir Blanc e o auxílio emergencial para os trabalhadores da cultura. Esse PL 795/2021 está na Câmara, para deliberação. Certamente, será uma ajuda considerável. O Congresso também aprovou e encaminhou para sanção presidencial o PL 5.638/2020, com medidas compensatórias às perdas de receitas sofridas por empresas de eventos e turismo. Com a retomada dos trabalhos das comissões, mesmo de forma não presencial, a Comissão de Educação, Cultura e Esporte continuará contribuindo para fortalecer a economia cultural.


ABRIG: A economia cultural está diretamente ligada à indústria criativa, que pode ser definida como a indústria que tem origem na criatividade, habilidades e que tem potencial para criar empregos e ganhos da propriedade intelectual. A indústria cinematográfica é um dos destaques da indústria criativa. Como a sra pode avaliar a atual situação da Ancine?


LEILA BARROS: A diretoria da Ancine parece estar concentrando suas energias em um projeto de desmonte da cultura nacional. Não foi à toa que, no início de abril, o órgão se negou a enviar representante para participar de audiência pública a respeito de políticas de apoio à produção audiovisual, realizada na Comissão de Cultura da Câmara dos Deputados. Segundo um dos participantes da reunião, o procurador da República Sérgio Gardenghi, 782 projetos audiovisuais já contemplados em editais entre 2016 e 2018 estão paralisados na Ancine. O setor parece estar abandonado. A paralisação das atividades presenciais e das comissões impede que seja realizada a sabatina com os indicados pelo governo para a diretoria da Ancine. Trata-se de um processo importante para entendermos quais são os planos, o conhecimento e a capacidade das pessoas apontadas pelo governo para ocupar a diretoria da Ancine.


ABRIG: Quando falamos na economia cultural e da indústria do entretenimento, logo pensamos na distribuição. Estamos falando da regulação da TV Aberta, TV Paga e Streaming. Como a sra avalia as políticas públicas que regulamentam a distribuição das produções?


LEILA BARROS: No final de 2020, o governo anunciou que em 90 dias a Anatel e o Ministério das Comunicações apresentariam uma minuta para atualizar a lei da TV paga. Por sua vez, tanto a Câmara quanto o Senado estão analisando projetos que tratam da regulação dos serviços de streaming e da atualização das regras. Considero muito importante que esses temas sejam debatidos com todos os atores envolvidos, para que o nosso país possa ganhar uma legislação moderna que permita o desenvolvimento do setor de audiovisual.


ABRIG: O Comitê de Cultura da Abrig menciona a cultura como “softpower”, instrumento influenciador para dar prestígio e notoriedade a um país e assim ajudar no crescimento econômico. Como a sra avalia o conceito de cultura e softpower?


LEILA BARROS: Vamos precisar de todas as alternativas para reconstruir a imagem do nosso país. Infelizmente, não estamos com uma boa imagem perante o mundo. O desleixo com que o governo tratou o combate ao coronavírus e a política de “passar a boiada”, que estimula a degradação do meio ambiente, impactaram na forma como passamos a ser vistos. Vamos precisar, sim, da força e da reputação que a nossa cultura goza no exterior para remodelar a forma como nos enxergam. Apesar de termos nossas mazelas e crises políticas, sempre seremos uma nação formada por gente alegre e hospitaleira, por pessoas honestas e trabalhadores e donos de uma riqueza cultural e natural única. Essa é a essência do brasileiro.


Leila Barros é senadora. 



*Os conteúdos publicados são de inteira responsabilidade de seus autores. As opiniões neles emitidas não exprimem, necessariamente, o ponto de vista da Abrig.  


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